Segmento onde estão Ferrari, Rolls-Royce e Bentley movimentou a R$ 382,5 bi só no ano passado

Apesar de a pandemia não dar trégua, marcas de luxo comemoram recordes de vendas e faturamento no fechamento de seus balanços de 2021, puxadas – quem diria?!? – pela China. A verdade é que, a despeito da crise sanitária e do avanço da pobreza em todos os continentes, Rolls-Royce, Bentley e Ferrari, apenas para citar três fabricantes, comemoram recordes históricos.

“Temos, hoje, a carteira de pedidos mais robusta de nossa história, dois dígitos acima de 2021 e cobrindo até 2023”, disse à agência “Reuters” o presidente-executivo (CEO) da Ferrari, Benedetto Vigna. As vendas da marca do ‘cavallino rampante’ chegaram a 11.155 unidades, o que representou um crescimento de 22% sobre o ano passado e de 10%, comparadas a 2019, ainda na pré-pandemia.

“Vamos reforçar a excelência de nossos produtos, apostando na neutralidade carbônica até 2030, porém mantendo fidelidade ao nosso DNA”, acrescentou, fazendo referência ao fato de recorde se dar justamente no momento em que a indústria automotiva se prepara para a virada da eletromobilidade.

Como o leitor já deve saber, a montadora não sobrevive de fazer os superesportivos mais desejados do mundo ou de ver os ‘tifosi’ agitando as bandeiras, nas arquibancadas da Fórmula 1, mas de lucros. São os ganhos que movem a roda deste negócio e, no caso da Ferrari, o lucro líquido da marca subiu nada menos que 37%, em 2021, alcançando o 833 milhões de euros (o equivalente a R$ 5 bilhões e, apenas para o leitor ter um parâmetro de comparação, a Tesla lucrou R$ 12 bilhões, só no último trimestre do ano passado). Bom, apesar de serem menores que os da Tesla, os ganhos da Ferrari foram, digamos, em parte “comunizados”, já que todos seus 4.500 colaboradores receberão um bônus de até 12 mil euros (o equivalente a R$ 71 mil).

E por falar em comunização, China, Hong Kong e Taiwan foram a região onde as vendas mais cresceram, nada menos que 97% – na Europa, as comercializações tiveram alta de 14% e, nos EUA, 22%. Bom, ao mesmo tempo em que implementa sua estratégia de eletrificação, a Ferrari segue uma disciplina financeira rigorosa. “Os resultados de 2021 demonstram a força do nosso modelo de negócio e, para tanto, gerenciamos cuidadosamente nosso crescimento, preservando a exclusividade da marca”, salienta Vigna.

 “Ano fenomenal”

Na ponta oposta dos superesportivo, ou seja, no outro extremo da linha da excelência (no caso, a da opulência e suntuosidade), a Rolls-Royce também comemora um novo recorde de vendas e segue planejamento semelhante: “Em 2021, comercializamos 5.586 unidades, maior volume em nossos 117 anos de história”, disse o presidente-executivo (CEO) da marca, Torsten Müller-Ötvös. Se o número não impressiona quem está acostumado com os dos modelos populares, é importante frisar que, em plena pandemia, ele representou um crescimento de 49% nas vendas da Rolls-Royce. O resultado foi puxado por China, em primeiro lugar, e Estados Unidos. “Foi, realmente, um ano fenomenal, que nos incentiva para seguirmos como uma marca de luxo única, além de todas as outras”.

Única marca à altura da Rolls-Royce, quando se trata de exclusividade, a Bentley também registrou um novo recorde – o segundo seguido – com mais de 14.600 unidades comercializadas, em 2021. “Apesar de toda a imprevisibilidade, tivemos um sinal muito positivo de nossa força, mas este resultado só foi alcançado devido à nossa excelência operacional e a afirmação de nossas prioridades estratégicas”, pontua o presidente-executivo (CEO) da montadora, que faz parte do Grupo Volkswagen, Adrian Hallmark. Só no mercado chinês, o resultado comercial da Bentley, no ano passado, foi 40% superior ao de 2020 – nada mal para uma marca cujos produtos chegam a custar US$ 2 milhões (o equivalente a mais de R$ 10 milhões), no mercado externo.

Enquanto o debate brasileiro segue focado na demonização do comunismo, na normalização do nazismo e na relativização de que o mercado nacional de automóveis registrou queda de mais de 7%, em 2021, o segmento de alto luxo fechou o mesmo período com um crescimento de 36%, na China. De acordo com a consultoria norte-americana Bain&Company, o segmento em que se inserem os modelos da Ferrari, Rolls-Royce e Bentley, além de outras marcas de prestígio, movimentou a cifra de US$ 73,6 bilhões (R$ 382,5 bilhões) no mercado chinês, no ano passado. “A China é, hoje, o maior mercado de consumo do mundo, onde o aumento médio da renda supera o da inflação”, pondera a analista Weiwei Xing. “Nossa estimativa é que a China também será o maior mercado de luxo global, já em 2025”.

Previsão de R$ 1,35 trilhão

O país da Grande Muralha responde, hoje, por 30% das vendas da Bentley. Lá, o utilitário-esportivo (SUV) Bentayga e o sedã FlyingSpur são os carros-chefe de um negócio que, só no ano passado, chegou a US$ 210 milhões (o equivalente a R$ 1,09 bilhão). “Esperamos que a versão híbrida plug-in do FlyingSpur incremente ainda mais estes números”, declarou o CEO da marca, Adrian Hallmark. A China também foi o maior mercado da Audi (701,2 mil unidades) e dos Mercedes-Benz Classe S e Maybach (mais de 10 mil, de um total de 15.730 unidades vendidas no mundo todo), além de ter sido o segundo maior mercado da Lamborghini.

A China é, indiscutivelmente, a “menina dos olhos” da indústria automotiva, principalmente das gigantes alemãs, que também são as mais impactadas pela ofensiva das marcas chinesas nos mercados periféricos, que sempre foram dominados pelas companhias germânicas. Segundo a ResearchandMarkets, em 2026, as vendas de automóveis de alto luxo atingirão inacreditáveis US$ 260 bilhões (o equivalente a R$ 1,35 trilhão) no mercado chinês. “Em termos de políticas e reformas tributárias, o país considera um corte de impostos que pode estimular ainda mais seu setor automotivo. O mercado é altamente impulsionado por fatores tecnológicos, investimento crescente e aumento do padrão de vida das pessoas”, destaca o report “Asia-PacifcLuxuryCars Market 2022”, da consultoria.

Nunca é demais lembrar que, há exatos 40 anos, o Brasil tinha um Produto Interno Bruto (PIB) 32% superior ao da China e que, hoje, nossa produção industrial é dez vezes menor que a chinesa. Onde foi que erramos?!?

Por Homero Gottardello