Derretimento das ações da marca de Elon Musk, revela que empresário precisa mais de Trump do que o contrário

Em dezembro do ano passado, nas semanas que antecederam o início do desafino entre as melodias cantadas por Elon Musk, dono da Tesla, e Donald Trump, presidente norte-americano, a montadora de veículos elétricos alcançou sua maior valorização de mercado, com um pico de US$ 1,42 trilhões (o equivalente a R$ 7,9 trilhões). Mas a exemplo do que já aconteceu com algumas das maiores parcerias musicais da história, a dupla foi abalada pela vaidade, no caso pela de Musk que, discordando dos ditames políticos de Trump, se insurgiu contra o “Laranjão”. Bom, passados seis meses, parece claro que o empresário sul-africano precisa mais do apoio da Casa Branca do que o contrário. “Sem mim, ele teria perdido a eleição e os Democratas – partido que faz oposição ao governo – controlariam a Câmara”, disse Musk, na última quinta-feira, confessando a interferência direta de sua rede social, o “X” (ex-Twitter), na corrida presidencial de 2024. “Hora de soltar a bomba: Donald Trump está nos arquivos de – Jeffrey – Epstein”, fazendo referência a um escândalo de abuso sexual e tráfico internacional de menores, e, literalmente, apelando para a boa e velha chantagem.
Trump respondeu ao seu estilo, desdenhando do acusador e, a julgar pela queda de mais de 30% nas ações da Tesla, tudo indica que Musk já saiu perdendo. Nos seis meses em que a parceria se converteu em inimizade, a montadora perdeu mais de US$ 450 bilhões em valor de mercado (o equivalente a R$ 2,5 trilhões). Uma das razões do derretimento seria o fim dos incentivos fiscais do governo norte-americano para veículos elétricos, aprovado pelos legisladores, que impactará muito negativamente nos negócios do sul-africano. “Elon conhecia o teor deste projeto de lei melhor do que quase qualquer pessoa. De repente, ele se deu conta de que seria impactado e, a partir daí, enxergou problemas”, apontou Trump com sua “sinceridade” habitual.
O namoro com o Laranjão começou não tem tanto tempo, já que Musk só passou a investir abertamente na campanha de Trump, após o atentado de julho do ano passado, na Pensilvânia. Sensibilizado, o chefão da Tesla teria aportado quase US$ 300 milhões (o equivalente a R$ 1,66 bilhão) na sua campanha. “Elon ficou insatisfeito, porque o projeto de lei aprovado não inclui políticas de seu interesse pessoal e, então, simplesmente enlouqueceu”, avalia Trump, que ameaça cancelar os contratos que a SpaceX e a Starlink, duas empresas de Musk, têm com o governo norte-americano – o que deixaria o empresário com as calças na mão. Apesar do diz que me disse, parece claro que o sul-africano quis repetir, nos Estados Unidos, a mamata que conseguiu no Brasil, quando Jair Bolsonaro era presidente.
O projeto de lei de gastos que tramita no Congresso dos EUA aumentará a dívida nacional do país em US$ 2,4 trilhões (o equivalente a R$ 13,3 trilhões) ao longo da próxima década, mas deixará quase 11 milhões de norte-americanos sem seguro de saúde subsidiado pelo poder público. Acontece que Musk, que nunca se opôs à retirada dos benefícios, ficou revoltado quando viu os incentivos para EVs serem descontinuados – na base do “pimenta no olho dos outros é refresco” e “venha a nós o Vosso reino”.
Destituição
Todos sabem que tanto a empresa de foguetes quanto a de internet via satélite de Elon Musk só se sustentam por meio da injeção de bilhões de dólares governamentais. Como ambas têm capital fechado, Musk manda e desmanda, mas na Tesla, que é uma fabricante de automóveis de capital aberto, os investidores já deram o grito e, diante da queda nas ações que chegou a bater em -37%, em março, estão dispostos à remoção o chefão do cargo de presidente-executivo (CEO). “Por que o Conselho de Administração permanece em silêncio, enquanto tanto valor da marca foi corroído a ponto de carros serem incendiados?”, questiona Ross Gerber, gestor da Gerber Kawasaki Wealth and Investment Management e controlador de 250 mil ações da marca. “É preciso conter Elon. Com suas declarações extremistas, ele se tornou prejudicial à própria empresa”, acrescenta.
A volatilidade da Tesla ocorre, é verdade, após uma grande alta de oito semanas, quando Musk confirmou que a marca testaria um serviço de robotáxi autônomo e sem motorista em Austin (Texas), a partir deste mês. “Ocorre que, em termos regulatórios, não há pressa por parte do governo norte-americano para este segmento e isso também afeta, diretamente, os planos da Tesla – na verdade, táxis autônomos podem ser vistos em enxames, em metrópoles da Costa Oeste e, mais verdade ainda, Musk está até atrasado em relação a isso. Musk planejava tê-los em 20 ou 25 grandes cidades, já no ano que vem, mas o ambiente regulatório não é favorável para isso”, conta o analista da consultoria Wedbush Securities, Dan Ives.
De volta à SpaceX, Trump ameaça cortar os contratos governamentais que sustentam a empresa de foguetes, terceirizada da NASA, que recebeu bilhões de dólares para enviar astronautas e cargas à Estação Espacial Internacional. “Isso ocorre justamente no momento em que uma rodada de financiamento privado, que seria seguida por uma venda privada de ações, teria avaliado a companhia em US$ 350 bilhões (o equivalente a quase R$ 1,8 trilhão), valor bem acima dos US$ 210 bilhões (R$ 1,15 trilhão) estimados ainda no ano passado”, destaca Ives.
Como o leitor pode ver, os dois maiores bufões do mundo não se pautam por mais do que seus próprios egocentrismos, sempre de olho nas gordas tetas do governo norte-americano – aquele que, aqui no Brasil, as pessoas enxergam como liberal. Como é o contribuinte de lá quem paga a conta, enchendo os cofrinhos de Trump e Musk, enquanto esvazia seus próprios bolsos, a melhor forma de assistir a eles se digladiarem é daqui do Brasil, bem de longe, e sem nenhum tipo de envolvimento. Até porque quando se trata de gente tão patife e desonrada, não dá para desconsiderar a hipótese de reconciliação entre os dois.









