Mais barato que o hidrogênio verde, álcool metílico tem custo de produção até R$ 2,66, o litro; o etanol fica entre R$ 2,22 e R$ 2,36

Desde 2019, a China tem uma política de incentivos para o uso de metanol como combustível no transporte público, em táxis e nas frotas governamentais, além dos transportes pesado de longas distâncias e marítimo; nos últimos dois anos, a COSCO Shipping Bulk, dona de 400 navios graneleiros e maior empresa do setor em nível global, dobrou o número de embarcações movidas a metanol. – CRÉDITO – Imagem gerada por IA com licença para uso editorial
Os recentes episódios de intoxicação por destilados com metanol trouxeram o álcool metílico (CH3OH) para o centro das discussões, mas pouco se fala da sua aplicação para a descarbonização do segmento de transportes, como alternativa aos combustíveis fósseis (nominalmente, à gasolina). Desde 2022, o Ministério da Indústria chinês elegeu o produto como peça-chave para alcançar a neutralidade em emissões, até 2060. “Seguimos explorando, ativamente, novas maneiras para substituir a gasolina, como o hidrogênio verde e o metanol”, destaca o Doutor em Engenharia, professor de Biologia Vegetal da Universidade de Hong Kong e ex-diretor da Administração Nacional de Energia da China, Zhang Jianhua. “Há mais de uma década, o álcool metílico vem sendo discutido e testado como combustível para fazer a transição energética da indústria automotiva chinesa, reduzindo tanto a poluição ambiental como a dependência do petróleo. Na verdade, sua adoção comercial foi adiada por muito tempo, antes desse impulso”, detalha Jianhua.
Em 2024, o consumo global de metanol atingiu 135 milhões de toneladas e, hoje, a China responde pela produção e uso de 60% deste total, mormente na fabricação de plásticos – só no Brasil, o consumo de etanol no mesmo período foi de 21,1 bilhões de litros, ou seja, 120 vezes maior. Há 13 anos, os chineses iniciaram pesquisas com carros movidos a metanol, incentivando as montadoras, enquanto coletavam dados sobre seus impactos econômicos e ambientais. A conclusão foi que este combustível pode ser 21% mais eficiente do que a gasolina, em termos de energéticos, emitindo 26% menos dióxido de carbono. Desde 2019, há uma política de incentivos para seu uso no transporte público, em táxis e nas frotas governamentais.
Antes de dar sequência, cabe ressaltar que os automóveis brasileiros movidos a etanol, que é o álcool etílico hidratado da bomba, não podem usar metanol, que tem ação corrosiva e causa danos nos sistemas de alimentação, injeção e outras partes móveis do motor. A manipulação do produto por frentistas também traz riscos de intoxicação e nunca é demais lembrar que o combustível tem chama incolor, somando um perigo invisível em caso de incêndio. No Brasil, além de ser utilizado como solvente industrial, o metanol é usado na composição do biodiesel, fins regulamentados e lícitos que não têm a menor correlação com sua adição criminosa em bebidas destiladas falsificadas.
Transportes rodoviário e marítimo
De volta aos aspectos positivos do metanol, o combustível também é visto como boa alternativa para veículos pesados e o transporte rodoviário de longas distâncias. “Os caminhões elétricos atuais demandam enormes pacotes de baterias, o que os torna muito mais caros do que os modelos convencionais. Já os movidos a metanol têm custo semelhante ao dos caminhões tradicionais, movidos a gasóleo (diesel), o que é muito importante para os transportadores asiáticos que, em sua maioria, trabalham individualmente – e não como agregados de grandes transportadores, como ocorre no Brasil. Não se pode esquecer que a neutralidade em carbono tem que ser viável para repetirmos o sucesso obtido com os veículos elétricos no transporte pessoal, em que saltamos de 20 mil EVs para mais de 20 milhões, em uma década”, pontua Jianhua.

Desde 2019, a China tem uma política de incentivos para o uso de metanol como combustível no transporte público, em táxis e nas frotas governamentais, além dos transportes pesado de longas distâncias e marítimo; nos últimos dois anos, a COSCO Shipping Bulk, dona de 400 navios graneleiros e maior empresa do setor em nível global, dobrou o número de embarcações movidas a metanol. – CRÉDITO – Imagem gerada por IA com licença para uso editorial
O mesmo vale para o transporte marítimo, já que a Cosco Shipping Bulk, dona de 400 navios graneleiros e maior empresa do setor em nível global, dobrou o número de embarcações movidas a metanol, só nos últimos dois anos. “Suas principais vantagens são a densidade, que não afeta a capacidade de carga dos navios, o fato de ser relativamente seguro para o abastecimento e, obviamente, seu preço atrativo”, lista o presidente da companhia com sede em Xangai, que transporta 40 milhões de toneladas anuais, Gu Jinsong. “O metanol é uma solução neutra em carbono prontamente disponível, que ganha popularidade no setor marítimo, especialmente considerando que outras alternativas, como a amônia, ainda têm um longo caminho a percorrer. É um produto que encabeça a curva de transição energética deste setor”, complementa Jinsong.
O metanol chinês tem custo de produção entre US$ 0,03 (o equivalente a R$ 1,60) e US$ 0,05 (R$ 2,66), o litro, enquanto o etanol brasileiro fica entre R$ 2,22 e R$ 2,36, o litro – números que não incluem custos de transporte e outros custos operacionais. Já sobre a vantagem em densidade, enquanto um litro de metanol pesa 790 gramas, o do “bunker fuel” (que é o diesel usado pelos grandes cargueiros) pesa 980 g ou quase 25% mais, o que, levando-se em conta o consumo diário de até 350 mil litros, pode aumentar a capacidade operacional em até 4.000 toneladas por viagem.