Baterias em estado sólido prometem acelerar as metas da indústria; químicas com íon de sódio, LMFP e Li-S são outras alternativas ao lítio

Mais de 450 quilômetros de alcance em apenas 15 minutos de parada para recarga. Esta é a meta da indústria para as baterias automotivas, algo que pode se tornar uma espécie de padrão já em 2028, resolvendo a contento um dos dois grandes senões da virada da eletromobilidade. “As baterias em estado sólido representam um grande avanço para os EVs, em relação aos conjuntos atuais de íon de lítio. São menores, têm maior densidade energética e também são mais seguras, além de oferecerem mais autonomia com um custo inferior. Mas é uma tecnologia de pequena escala e levá-la ao mercado de massa ainda impõe desafios”, avalia o pesquisador do Laboratório norte-americano de Energia Renovável (NREL), Andrew Colclasure. “As baterias de estado sólido são mais confiáveis, garantem maior alcance e têm maior vida útil, quando comparadas às atuais. São vantagens mais do que consideráveis, não é à toa que a Toyota já anunciou que irá implementá-las em seus veículos elétricos a partir de 2030”, acrescenta Colclasure, que trabalha no laboratório de Golden, no Colorado.

A virada da eletromobilidade é dinâmica e há uma série de outras químicas para baterias veiculares que vêm surgindo e sendo testadas, na medida em que os EVs escalam, globalmente. No caso dos modelos de estado sólido, a denominação remete ao fato de seu eletrólito, componente que transfere partículas carregadas (os íons) entre os eletrodos da bateria, ser feito de material sólido, enquanto os pacotes convencionais possuem eletrólitos líquidos.

A corrida por uma solução definitiva se justifica no custo das baterias veiculares: comparado aos motores a combustão interna, um conjunto chega a custar US$ 10 mil (o equivalente a R$ 54,9 mil) a mais para o fabricante, o que, de um lado, encarece o produto final e, do outro, corrói as margens de lucro das montadoras. “Hoje, há muitas alternativas potencialmente promissoras para baterias de íons de lítio, mas todas elas esbarram em desafios de engenharia e custos”, conta o diretor do grupo de eletrificação veicular da Universidade Carnegie Mellon, de Pittsburgh, Jeremy Michalek.

NMC, LFP, LMFP e Li-S
De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA), globalmente, cerca de 60% dos EVs dependem de baterias de óxidos de lítio-níquel-cobalto-manganês (mormente abreviados como NMC, mas também encontrados como Li-NMC, LNMC ou NCM). Esta química responde pela maioria dos EVs vendidos nos Estados Unidos, por exemplo, enquanto as baterias de fosfato de ferro-lítio (LFP) são a opção crescente, principalmente na China, onde equipam 30% dos modelos elétricos 0 km – são, hoje, o conjunto mais em conta para a indústria. O fato é que entender estas siglas e saber o que cada uma delas significa é tão importante como compreender as configurações um motor de quatro cilindros em linha, um V6 ou um V8, bem como as cilindradas de um “milzinho” e um propulsor de grande deslocamento, além das diferenças entre gasolina, etanol e gás natural veicular (GNV).

Para quem deseja atualizar seus conhecimentos, é importante saber que há outras alternativas como as baterias de íon de sódio (em substituição do lítio), que usam matéria-prima abundante e mais facilmente extraída, cerca de 35% mais baratas. “O problema, aqui, é que o sódio é cerca de três vezes mais pesado do que o lítio, o que aumenta a massa do conjunto e limita o alcance”, pontua o analista sênior da AutoForecast Solutions, principal fornecedora de dados para planejamento automotivo, Conrad Layson. De qualquer forma, é uma química em evolução “Há uma boa chance de esta alternativa se estabelecer, comercialmente”, avalia a professora de engenharia mecânica da Universidade Carnegie Mellon, Reeja Jayan.

As baterias de fosfato de ferro-manganês-lítio (LMFP) são acessíveis e disponíveis, combinando o melhor das células de níquel-cobalto-manganês (NMC) com o melhor das células de fosfato de ferro-lítio (LFP). Sua vida útil é menor do que a desta última, mas a densidade de energia é maior. O enxofre de lítio (Li-S) tem uma densidade de energia relativamente alta e pode carregar rapidamente. Trata-se de uma matéria-prima farta e barata, comparada ao cobalto e ao níquel, mas este tipo de bateria ainda não tem aplicação automotiva – estima-se, todavia, um custo 50% menor.
Estado semissólido

“Baterias de estado semissólido oferecem benefícios semelhantes aos das de estado sólido e, neste estágio de desenvolvimento, estão até mais próximas da comercialização. Sua química traz pequenas quantidades de líquido ou gel que difundem íons rapidamente, enquanto os pacotes tradicionais – de íons de lítio – são inundados com eletrólitos líquidos, mais propensos a incêndios”, avalia o líder global de análise de armazenamento energético do Boston Consulting Group, uma das maiores consultorias globais, Nathan Niese. Já a californiana QuantumScape, apoiada pela Volkswagen e pelo cofundador da Microsoft, Bill Gates, desenvolveu um eletrólito cerâmico que elimina o ânodo de grafite formador de dendritos.

De certo, tem-se que a tecnologia de estado sólido está avançando rapidamente e a industrialização é o próximo passo. “Não se trata de nos perguntarmos se podemos, ou não, fazer isso, mas de solucionarmos a questões de volume para entregarmos esta tecnologia para nossos clientes, para as montadoras”, afirma o presidente-executivo (CEO) da QuantumScape, principal desenvolvedora norte-americana de baterias em estado sólido, Siva Sivaram. “Demos muitos passos e, agora, é preciso darmos um salto. Nos últimos dez anos, evoluímos muito e chegou o momento de os desenvolvedores testarem esta tecnologia sob condições realistas”, completa Sivaram.

Ao que parece, a indústria já passou da metade do caminho, mas ainda há muito chão para ser percorrido, antes da linha de chegada.