Projeto reduz despesas operacionais de R$ 650 mil para R$ 160 mil até 2030
Por Homero Gotardello

Enquanto a Xpeng confirma o lançamento de seu Robotaxi para 2026, o setor automotivo como um todo ainda vive uma grande expectativa em relação à condução autônoma: de um lado da balança, a queda nos custos de produção dos EVs e as novas capacidades da inteligência artificial (IA) vêm encorajando a implementação desta tecnologia, mas, como qualquer outro negócio, este tem que ser lucrativo e os operadores têm enormes gastos com aquisição e manutenção dos AVs, supervisores humanos, telefonia móvel, monitoramento remoto, financiamento, seguro e despesas corporativas, isso sem falar na depreciação dos próprios automóveis – Crédito: Imagens geradas por IA com licença para uso editorial
A queda nos custos de produção dos EVs e as novas capacidades da inteligência artificial (IA) vêm aproximando os robotáxis da realidade global. Digo global, porque em algumas metrópoles chinesas e norte-americanas, os veículos autônomos por aplicativo já são tão comuns quanto um táxi tradicional. Há cidades na China onde este serviço é ofertado por frotas que ultrapassam as 5.000 unidades e, nos Estados Unidos, a Waymo (da Alphabet, dona da Google) acaba de ultrapassar a Lyft (maior concorrente local da Uber) em São Francisco, na Califórnia, onde já detém a segunda maior participação de mercado – ela também opera em Los Angeles, Phoenix (Arizona), Austin (Texas) e, em breve, Nova Iorque. A empresa iniciou, recentemente, testes no Japão, ao mesmo tempo em que a WeRide, líder deste segmento em nível mundial, segue expandindo seus negócios com presença em mais de 30 cidades de dez países– Abu Dahbi é a mais recente inclusão no cardápio. “Há um grande otimismo e até mesmo o trágico acidente em que um modelo da Cruise atropelou um pedestre, em 2023, parece superado. Mas, apesar do grande avanço técnico, as margens de lucro projetadas para o futuro não parecem tão fáceis de serem alcançadas”, avalia a jornalista e editora da agência “Thomson Reuters”, Katrina Hamlin, que cobre este setor desde 2012.
Em outubro do ano passado, analistas da Morgan Stanley estimavam que o modelo usado pela Waymo tinha um custo unitário de US$ 120 mil (o equivalente a R$ 650 mil), projetando uma redução para US$ 85 mil (R$ 460 mil), na segunda geração de seu robotáxi. No último mês de julho, analistas do Goldman Sachs estimaram que, até 2030, este custo unitário baixaria para US$ 50 mil (R$ 270 mil), valor substancialmente mais alto do que o projetado pelo Baidu para sua própria frota, que estaria na casa de US$ 30 mil (R$ 160 mil). Também entre os desenvolvedores, a chinesa Hesai Technology anunciou que a nova geração de seu – radar – LiDAR será fornecida pela metade do preço atual.
“Dos padrões incrivelmente rígidos e do emaranhado de redes neurais que exigiam uma quantidade absurda de dados e uma capacidade astronômica de processamento, os robotáxis evoluíram muito em termos de mapeamento e na atualização constante das áreas de operação, com IA generativas para tomada de decisões em tempo real. Na prática, isso capacita os veículos autônomos para casos extremos, estatisticamente improváveis, mas, como qualquer outro negócio, este tem que ser lucrativo”, lembra Katrina. “Os operadores têm enormes gastos com aquisição e manutenção dos robotáxis, supervisores humanos, telefonia móvel, monitoramento remoto, financiamento, seguro e despesas corporativas, isso sem falar na depreciação dos automóveis”, enumera.
No início desta semana, a Xpeng anunciou no IAA Mobility, em Munique (Alemanha), planos ambiciosos para o lançamento de seu Robotaxi (neste caso, trata-se do nome próprio do modelo autônomo da marca chinesa) e seus primeiros EVs de Nível 4 – hoje, os VAs mais avançados à venda têm automação de Nível 3. “Lançaremos o Robotaxi em 2026, na China, ao mesmo tempo em que finalizamos a versão comercial para o mercado europeu em nosso primeiro Centro de Pesquisas e Desenvolvimento (P&D) neste continente”, adiantou o presidente-executivo (CEO), He Xiaopeng. Praticamente desconhecida, no Brasil, a montadora já está presente em 46 mercados globais e 30% de seus colaboradores diretos estão alocados em P&D. A Xpeng é líder em direção autônoma, atrás da Grande Muralha, produzindo seu próprio controlador, o Turing AI, que tem como base uma tecnologia diferente do LiDAR. Mas será que a conta fecha?

Crédito: Imagens geradas por IA com licença para uso editorial
Parecidos com cavalos
Em outras palavras, quando se coloca uma lupa sobre este negócio, ainda há grandes desafios para torná-lo, efetivamente, rentável. “O próprio Elon Musk comenta que fazer um veículo autônomo percorrer 90% da rota programada é, relativamente, fácil e que o grande desafio se resume aos 10% restantes”, lembra o diretor da Horizon Robotics, parceira de desenvolvimento da Volkswagen entre outras montadoras, Yu Kai. “Eu acrescentaria que os robotáxis de hoje são muito parecidos com os cavalos usados como meio de transporte até o início do século 20: eles eram capazes de ir do ponto ‘A’ ao ponto ‘B’ de forma bastante confiável, mas não tinham a inteligência dos humanos. De modo que o cavaleiro ou o cocheiro de uma carruagem nunca puderam, simplesmente, entregar-lhes por completo a condução. O problema é que a margem de lucro está, justamente, nos 10% a que Musk se refere”, complementa Kai.
No Brasil, que vive em guerra com os Poderes Legislativo e Judiciário, a infantilização que sequestrou a grande maioria dos tupiniquins impede que se tenha uma compreensão da importância das questões regulatórias e legais, mas, no mundo adulto, tensões políticas também são um desafio para os táxis autônomos e influenciam sua expansão internacional. Os EUA, por exemplo, proibiram a tecnologia chinesa de carros conectados dentro de suas fronteiras e, lá, há uma ameaça constante de controles mais rigorosos sobre chips e equipamentos que obstaculizam o desenvolvimento.
A imprevisibilidade está em todo lugar, já que decisões de reguladores locais sobre questões como o número necessário de monitores ou onde as frotas podem operar são apenas a “ponta do iceberg”, influindo em escalas de custos e receitas. Basta pensar que um único acidente fatal pode desencadear controles mais rígidos e assustar os clientes, sem contar que grupos de poder podem manter os robotáxis apartados de certos mercados. Apesar das incertezas, a Uber injetou US$ 300 milhões (o equivalente a R$ 1,63 bilhão) na Lucid, no final de julho, num acordo que prevê a aquisição de 3% de participação no fabricante norte-americano de EVs de luxo, além da compra de 20 mil unidades “personalizadas” do seu e-SUV, o Gravity, a partir do segundo semestre de 2026.
“Certo é que estamos vendo o ‘Auto sapiens’ nascer, um veículo capaz de interagir com o usuário e o ambiente, processar informações, aprender e agir de forma autônoma. É claro que isso terá muitas implicações e o setor energético serve de exemplo: daqui a dois anos, na Itália, só o consumo anual de eletricidade para IA será igual a 50% do atual para todos os setores. Apenas as aplicações automotivas de inteligência artificial receberão 70 bilhões de euros (o equivalente a R$ 446,5 bilhões) de investimentos, até 2030, em todo o mundo”, detalha o engenheiro e professor Fabio Orecchini, presidente do Observatório Automotivo e de Mobilidade da Libera Università romana. “Trata-se de um negócio bilionário, criado pela aliança das indústrias da mobilidade e tecnologia”, acrescenta.
Como o leitor pode ver, o futuro já chegou em muitos mercados e, mesmo que ele só possa ser projetado até certo ponto, está destinado a transformar os automóveis e a forma como os usamos.