Crescimento dos eletrificados (com micro-híbridos) chega 20% e carros a combustão têm queda de 1,3% de janeiro a outubro

Participação dos híbridos convencionais, flexíveis, plug-in e dos EVs, no Brasil, é de mais de 8%, fatia que chega a quase 11%, se somarmos os micro-híbridos; hoje, apenas duas marcas têm maior quinhão nas vendas nacionais, Fiat e Volkswagen – General Motors, Hyundai, Toyota, Renault e todas as que as seguem abocanham uma fatia menor do bolo que a dos modelos eletrificados – Imagem gerada por IA, com licença para uso editorial
O Brasil está, definitivamente, inserido na virada da eletromobilidade. Pela primeira vez, os automóveis equipados com motor a combustão interna registram queda (-1,3%), no mercado nacional. O volume acumulado entre janeiro e outubro pelos modelos convencionais, de 1,835 milhão de unidades, é inferior ao anotado no mesmo período de 2024, de 1,861 milhão de unidades. O resultado mostra que 2025 será o grande marco para os veículos de novas energias, apoiado por uma infra-estrutura de recarga para EVs e híbridos plug-in que ruma para 17 mil pontos. “A virada da eletromobilidade segue a pleno vapor e continuará acontecendo, com ou sem a participação deste ou daquele país. Há regiões – como o Brasil – que vêm sofrendo pressão das antigas montadoras para flexibilizarem suas metas de emissões, dando sobrevida aos modelos equipados com motores a combustão interna, mas a realidade é que as vendas de veículos elétricos (EVs) estão em franca expansão e as regulações são essenciais para as indústrias automotivas nacionais serem competitivas na corrida global. Na verdade, vivemos o exato momento em que os líderes da transição energética serão definidos para o futuro”, aponta o diretor executivo da Federação Europeia do Transporte e Meio Ambiente (T&E), que reúne entidades não governamentais para promoção da sustentabilidade do setor, William Todts.
Ele fala de uma coisa da qual poucos brasileiros se dão conta: de que economias emergentes estão entre os mercados onde os EVs mais vêm ganhando terreno e que o Brasil já tem taxa de adoção próxima da de países mais ricos. “Há um movimento coordenado entre montadoras e empresas de infraestrutura, consolidando o ecossistema da eletromobilidade no Brasil, que vem se tornando cada vez mais robusto e integrado”, atesta o presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) e diretor de relações Institucionais Great Wall Motor (GWM), Ricardo Bastos.
Os números são de clareza solar e, só neste ano, as vendas de modelos eletrificados (híbridos convencionais, flexíveis e plug-in, além dos EVs) cresceram quase 22%, no mercado brasileiro. Mais significativa é a diferença de quatro pontos percentuais que eles e os micro-híbridos delimitam no crescimento de 2,7% nas vendas nacionais, acumulado entre janeiro e outubro. Isso porque, os volumes dos modelos equipados com motores a combustão apresentam queda, no mercado brasileiro, com 26 mil unidades a menos nos dez primeiros meses deste ano, em relação a 2024. Traduzindo, são os carros de passeio e os comerciais leves de novas energias que estão puxando o setor para cima e, sem eles, 2025 seria um ano de retração no país.
Hoje, a participação dos híbridos convencionais, flexíveis, plug-in e dos EVs, no Brasil, é de mais de 8%, fatia que chega a quase 11%, se somarmos os micro-híbridos. Para o leitor ter uma ideia, apenas duas marcas têm maior quinhão nas vendas nacionais, Fiat e Volkswagen – General Motors, Hyundai, Toyota, Renault e todas as que as seguem abocanham uma fatia menor do bolo que a dos modelos eletrificados. “Dos 168,7 mil modelos eletrificados comercializados de janeiro a outubro, mais de 80% possuem recarga externa”, destaca Bastos, se referindo à preferência do consumidor pelo híbridos plug-in e pelos EVs, 100% elétricos.
São dados que credenciam o Brasil para se tornar uma referência continental na virada da eletromobilidade. Mas, para isso, é preciso superar o “viralatismo” e deixar de ser um mercado preferencial para a desova de modelos ultrapassados, equipados com motores a combustão.
Empregos e renda
“O desenvolvimento da indústria brasileira de EVs dependerá da nossa capacidade de criar novos empregos de alta qualidade e de fomentarmos a expansão de um setor nacional de componentes, como motores elétricos e baterias. Análises com foco setorial específico, que consideram apenas a produção de veículos e autopeças, por exemplo, ignoram que a grande maioria dos novos empregos criados decorre de mudanças em toda a estrutura produtiva e os impactos econômicos dependem da produção de automóveis e dos setores que fornecem diretamente para a cadeia de valor”, explica o doutor em Economia e codiretor do Centro de Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Universidade de São Paulo (USP), Pedro Romero Marques.
Comparado aos principais mercados do mundo, o Brasil ainda tem muito o que avançar, mas, num raro momento histórico, parece que estamos no caminho certo. Na França, por exemplo, a soma de híbridos convencionais, plug-in e EVs, além de micro-híbridos, já responde por 80% das vendas de carros de passeio, enquanto na Alemanha fica pouco acima de 70% e, no Reino Unido, está em 50%. É claro que o Brasil não é nem a Noruega, onde 99% das vendas correspondem a EVs (ou seja, modelos 100% elétricos), e nem a Suécia, onde eles têm uma participação de 66%, mas a distância para Portugal e Espanha, onde os híbridos plug-in e os EVs respondem juntos por 28% e 21% das comercializações, respectivamente, é até pequena – nos Estados Unidos, os EVs fecharão este ano com uma fatia de 8%.
Desde o final de 2020 até o meio deste ano, o número de pontos de recarga (públicos e semipúblicos) para híbridos plug-in e EVs saltou de 350 para 16.880, o que corresponde a uma alta astronômica de 4.700%. Ou seja, a disponibilidade para recarregamento cresceu 48,2 vezes em 50 meses – só no ano passado, o número de postos de combustíveis espalhados pelo Brasil caiu quase 3% em relação a 2023, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
“Em relação ao modelo produtivo atual, o cenário de eletrificação geraria mais que o dobro de empregos, no Brasil, até 2050, com o aumento da demanda agregada resultante do crescimento das vendas de EVs e da expansão da produção nacional de baterias automotivas”, projeta a professora do Instituto de Economia da Unicamp, Ph.D. em Economia e também codiretora do Made, Luiza Nassif Pires, no relatório ‘The transition to electric vehicles in Brazil’s automotive industry and its effects on jobs and income’, do Conselho Internacional de Transporte Limpo (ICCT). “Também ocorreriam mudanças na distribuição da renda e dos lucros do trabalho gerados pelas vendas de EVs, que sobem de 45%, no cenário atual, para 53% no de eletrificação”, complementa.
Este ano entrará para a história como o ponto de inflexão da virada da eletromobilidade, no Brasil, quando os modelos eletrificados apresentaram seus maiores ganhos e passaram a influenciar, diretamente, o desempenho comercial de todo o setor. É um caminho sem volta e que pode, depois de mais de uma década, nos fazer sonhar com números como o recorde de 3,6 milhões de unidades, registrado em 2012.









