Tendência pode resultar em aumento do trânsito e da poluição nos centros urbanos
O desejo de fazer as malas e cair na estrada nunca foi tão grande. A pandemia da Covid-19 deixou o mundo de ponta cabeça e plantou a incerteza quanto ao dia e a hora em que tudo voltará ao normal. Saber que lá fora ainda não é seguro fez com que os planos de pelo menos um terço da população mundial fossem adiados ou cancelados. Assim aconteceu com Marina Klink, fotógrafa ambiental que ao lado do marido, o navegador Amyr Klink, já viajou para as mais diversas regiões do planeta. O destino de Marina em 2020 já estava definido: conhecer a Islândia. Os cliques que seriam feitos pelo olhar da fotógrafa tiveram que esperar um pouco mais. O alto grau de contagio do coronavírus acendeu a luz vermelha em todos os setores e colocou as viagens em quarentena. Enquanto isso, as folhas do calendário viraram rapidamente, as horas correram nos relógios e num piscar de olhos um novo dia começava. A pergunta que não quer calar: quando vamos poder viajar novamente?
A espera pela volta à normalidade fez com que logo nos primeiros meses de isolamento social algumas estratégias fossem adotadas para que pudéssemos continuar saindo de casa para, ao menos, cumprir com o essencial. Não é de hoje que as viagens são responsáveis por carregar de um lado para o outro muitas das doenças que conhecemos. Em 1918, a chamada gripe espanhola, a influenza, se espalhou rapidamente pelo globo através das viagens. Na época, elas eram em sua maioria realizadas em navios, já que a indústria aérea ainda estava se desenvolvendo e os carros ainda não eram acessíveis a toda a população. Com a Covid-19 não foi diferente. As viagens de avião contribuíram para que o vírus se espalhasse rapidamente por todas as regiões colocando a população em quarentena. “Os transportes são um ótimo meio de propagação de doenças, particularmente pela capilaridade e pelo contato, por isso a suspensão de voos entre os países foi uma das primeiras atitudes das autoridades”, frisa Profª Dra. Márcia Regina Barros da Silva do Departamento de História da USP.
Com receio da contaminação, muitas pessoas deixaram de andar a pé e de transporte público e passaram a se deslocar somente de carro, moto ou de transporte por aplicativo, mesmo para a curtas distâncias. Para garantir o mínimo de segurança nas viagens, o setor automotivo investiu em pesquisas tecnológicas que pudessem auxiliar no combate a contaminação deixando os veículos menos suscetíveis à exposição do vírus. A indústria química Rhodia, por exemplo, desenvolveu um fio antiviral que pode ser utilizado na produção de tecidos para os estofados dos automóveis. Outra tecnologia é a criação de filtros mais eficientes no sistema de ventilação e climatização dos veículos. Luiz Carlos Moraes, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), aponta que as megatendências como a eletrificação e conectividade ganharam mais importância com a pandemia. Essas e outras tecnologias ligadas ao setor devem emergir como aliadas no cenário pós-pandemia.
Somando as inovações do setor automotivo à imensa vontade de viajar da população, nasce um novo questionamento: como serão as viagens pós-pandemia? Marina Klink aposta na busca por viagens em família ou em pequenos grupos, além do fortalecimento do turismo interno através das viagens de carro onde as pessoas se sentirão mais seguras. “Finalmente o brasileiro vai conhecer o Brasil”, afirma a fotógrafa e viajante. Outra tendência esperada pelo setor do turismo são os destinos de viagens na natureza nas quais os viajantes possam encontrar um menor fluxo de pessoas. Depois de tantos meses em confinamento em casa, muitas pessoas desejam poder ficar ao ar livre. Sombra e água fresca é a linha de pensamento que deve guiar a escolha dos próximos destinos. O litoral brasileiro, bem como as cidades do interior dos estados, poderão ser alvo do planejamento dos passeios do futuro.
O cenário onde as viagens serão em sua maioria feitas internamente, tendo o carro como principal transporte, pode refletir negativamente no futuro da mobilidade urbana. As cidades brasileiras mostram uma inércia em relação ao incentivo dos transportes alternativos tendo como resultado uma crise no transporte público. De acordo com Erika Kneib, arquiteta urbanista e pesquisadora na UFG, a perspectiva de mobilidade pós-pandemia poderá ser ainda mais insustentável que em momentos anteriores.
“Isso vai levar ao aumento dos índices de congestionamento, de acidentes, de poluição atmosférica, e ainda maior degradação do espaço urbano”, frisa a professora. A adesão dos passeios de bike e a pé se mostram como uma opção de viagem sustentável, barata e flexível podendo assim colaborar positivamente para o descongestionamento das cidades. Mesmo que para a atual mobilidade brasileira esse panorama não seja a realidade, Erika acredita que o incentivo e valorização do transporte coletivo, bem como a utilização dos meios alternativos, podem reverter o atual cenário da mobilidade e frear o uso exagerado do carro.
Por Juliana Faria da Silva – Estudante de Jornalismo da Universidade Taubaté
2ª colocada no Prêmio Autoinforme Estudantes de Jornalismo – Categoria Texto